stereoloser

31.3.05

Viva Hate



Há quase dez anos atrás fiquei muito chateado com alguém. Foi no dia que descobri que me considerava seu amigo mas consideração era algo inexistente da outra parte. Simplesmente parei de falar com Fulano.
Um dia perguntou se havia algo errado e esta era a oportunidade que precisava. Desabafei, turbilhão de palavras. Mágoa. Ficou parado, estático na minha frente. Nunca vou esquecer seu olhar naquele exato momento. Interpretei o silêncio e o olhar como "é verdade, você está certo. Não o considero meu amigo e nem faço questão, mas também nunca enganei você e disse que era seu amigo"€�.
Lágrimas e passos largos para me afastar rapidamente dele, que então esboçava um iní­cio de resposta. Fulan atrás de mim querendo falar e eu correndo tentando não ouvir. Hoje penso que assistir àquela cena deve ter sido cômico, na hora foi trágico. Corremos por quadras, eu na frente chorando, ele atrás tentando falar.
Meu preparo fí­sico era melhor. Quando a distância me tirou de seu campo de visão entrei sem bater no apartamento de colegas, próximo ao meu. Não os conhecia direito, mas ainda chorando, sem dizer uma palavra, deitei em uma cama e ali fiquei, soluçando. Surpreendi-me com aqueles quatro garotos que não me interrogaram, não olharam desconfiados, simplesmente continuaram suas vidas como se nada tivesse acontecido. Pareciam entender que algo não estava bem e não importava o que era. Se quis me esconder em um canto, para eles bastava.
Acabei dormindo e, quando acordei, vi Fulano deitado no chão ao lado da cama, também dormindo. Levantei sutilmente, fiz um aceno de obrigado aos "€œinvadidos"€� e saí­.
Vinte minutos depois cruzei na rua com Fulano. Ambos abaixamos a cabeça, continuamos nossas vidas e conversamos poucas vezes após o incidente.
Esta situação nunca deixou de me incomodar. Hoje ele é uma pessoa relativamente popular, conhecido por pessoas que ele não conhece. Com a fama também apareceram seus crí­ticos. Há pouco tempo me peguei, surpreso, defendendo-o ferrenhamente para um grupo anônimo que falava mal dele. Principal argumento: vocês não o conhecem, eu o conheci.
Que merda, o que será que ele queria me falar naquele dia? Nunca vou saber, por ser teimoso e orgulhoso.

Esta história não tem nada a ver com nada. ɉ só um gancho para dizer que infelizmente descobri que esse tipo de situação, quanto mais velho ficamos, mais machuca e que pior do que decepcionar-se com amigos é ter decepcionado.
Por mais que pareça vazio e irônico só consigo pensar em uma coisa agora: desculpe-me. Hoje tive a dimensão exata do quanto gosto de você e sei que te amo.
Escrevi ouvindo: Suedehead | Morrissey

24.3.05

Beautiful Freak



Sá? Sara? Sara Junqueira, fale comigo agora!
Lágrimas.
...

Hormônios. Sangue escorrendo entre a virilha. Transformações.
Não foi avisada. Não entendia. Que merda é essa?
Revolta. Vergonha fraternal. Filial.
Fuga. "Ah, por isso Planet Hemp! Hemp. Entendi."
Risadas dos mais experientes.
Preocupação paterna. Materna. "Apenas uma fase."
Machucados esperavam que passasse.

Descobriu que podia ser onisciente, onipresente, onipotente.
"Dá pra fazer com rolinho de dinheiro? Que nem nos filmes?"
Dava.
Já entendia muito bem os intervalos dos corrimentos. Não havia mais motivos para a revolta como não havia mais motivos para parar.
"Não entendi para que esquentar. Ah, dissolver."
Risadas experientes.

Não reconhecia-se. Quem era?
"Filha dos Junqueira? Assim, tão diferente?"
Hipócritas ou eufemistas. Diferente igual a acabada, magra, ridí­cula.
Alma dilacerada dos pais.
"Te amamos."
Revolta.
"Patéticos. Incautos. Incultos. É amamos-te."

Quem é?
"Me explica como podem suportar? Que morra."
"Os tratando desse jeito é o que merece."
Incultos. Tratando-os.
Todos cifrões investidos em uma recuperação perdida, impossí­vel.
Todo apoio. Amor. O óbvio. Nada muda.
...

Dose. Colher. Á�gua. Fogo. Garrote. Olho. Agulha. Bate. Pico. Ampola vazia. Mais. Over.
...

"Eu não choraria por essa..."
Olhos vermelhos e resposta: "Porque você não sabe o que é amar."
...

Cantarolando mentalmente enxuguei uma lágrima e afastei-me.
Permita-me.
Me permita.
Escrevi ouvindo: My Beloved Monster | Eels

23.3.05

Good Feeling



Então é isso. QR100!
Duelos, rock, suor, cerveja, ambos os três sexos e etc.
Há algum tempo nem a QR tem melhorado meu humor. Hoje não quero que nada estrague meu culto.

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Pra quem quer entender melhor, isto foi postado em 20 de agosto de 2004:
*aos incautos, QR é a abreviatura da Quarta Rock do James, o meu cantinho de sossego semanal.

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Como diz um Amigo meu, "quero ver a borracha feder". E espero que toque mais róque do que essa bandinha de merda [Travis] faz. Confesso, foi só pelo tí­tulo do CD e da música -que de róque tem muito pouco.
Escrevi ouvindo: All I Want To Do Is Rock | Travis

22.3.05

Winners Never Quit



Será que nunca desistem ou um bom perdedor sabe a hora de retirar-se?
Escrevi ouvindo: A Mind Of Her Own | Pedro The Lion

21.3.05

On Fire



The Delicate Sounds Of Thunder. Recomendadí­ssimo. Dos mesmos criadores do Smoke Kills.

Pra ajudar, tem um box vermelho do lado direito, em cima do banner de propaganda, escrito "View This Title". ɉ ali que você clica para ver a animação.

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Este é meu conceito de blue: Blue Thunder | Galaxie 500

Summer In Abaddon


...
Escrevi ouvindo: Bloods On Fire | Pinback

20.3.05

It's Fuckin' Borin' To Death

Meu carinho e preocupação transformaram-me em um chato.
Eu, um grande chato.
E agora? Resta-me a consciência e meus velhos olhos vermelhos.
Sábio é Dalton. Senhor, livre-se de mim. Livre-me de mim mesmo.

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Senhor
Livra-me dos chatos e Te agradecerei, oh Senhor. Rouba-me o emprego, planta-me em cada dedo a Tua unha encravada, mata-me de morte lenta e dolorosa, mas livra-me dos chatos. Há chatos demais, Senhor, nesta Tua cidade. Cobre a minha cabeça de piolhos, arranca os meus olhos das órbitas, Senhor, mas livra-me dos chatos.

Eles podem mais que Teu rum da Jamaica, que Teu éter sulfúrico. De Curitiba fugiram os Teus anjos, Senhor e, se fugiram, eles que eram anjos, o que será de mim?

Tuas pestes, Senhor, poupam aos chatos, são eles intocáveis ao Teu dedo? Claudionor eu Te perdôo, Senhor, a Valquiria que embebeu as vestes em álcool e ateou fogo eu Te perdôo, Senhor, as duas senhoras de nomes Lucinda e Perciliana que se engalfinharam durante a missa na Tua catedral, eu Te perdôo porque Te entendo, Senhor.

Não Te entendo, oh Senhor, por que poupas a eles, que são chatos. Por eles se perde o mel que a abelha ainda não cozinhou. Eles estragam o gosto do cafá ainda na xí­cara e azedam o leite no seio da mulher grávida.

Endureceste o coração contra mim: sou eu Faraó e são os chatos Teu povo? Não me poupes, Senhor, entre os malditos é o meu lugar. Abate-me com Tua mão pesada, eu Te abençoarei. Sacode-me no pó como fizeste com Job, ah, mas os amigos que mandaste consolar a Job não eram eles três chatos, Senhor?

Dalton Trevisan, Senhor, Lamentações de Curitiba, 1961.
Escrevi ouvindo: The Woke Of Jo | De Falla

15.3.05

Sideshow



Uma bela notí­cia para me alegrar. Eis que Twinemen grava um novo CD.
Agora só falta achar e conseguir fazer o download -e olha que tá difí­cil.

Para quem não sabe o Twinemen é a "continuação" do Morphine, formada um ano após a morte do Sandman, quando os outros dois integrantes (Conway e Colley) decidiram fazer uma turnê em homenagem póstuma ao vocalista junto com a Morphine Orchestra. Acabaram conhecendo a Laurie Sargent, que fazia parte do coral, e encantaram-se pela voz da moça. Depois disso acho que a idéia de prosseguir com o projeto foi meio natural.
Não é tão bom quanto a original mas dá pra matar a saudade.

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Confesso que achava que o Twinemen nunca mais gravaria. Para mim era projeto de um único CD, apenas para aproveitar a promoção da morte do Sandman.

Também achava que Kings Of Leon viraria banda de um único CD (ou pior, de um hit só, mas isso ainda está acontecendo) e descobri dias atrás que já existe o segundo. Convenhamos que é chato e não faz justiça ao primeiro, mas está nas prateleiras das lojas.

Argh. Às vezes sou muito mal. Tenho que aprender a ser menos agorento.

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Outra boa notícia é que as coisas estão andando. Se não conseguir baixar o Sideshow em breve devo buscar direto da fonte.

Escrevi ouvindo: Spinner [do primeiro CD] | Twinemen

11.3.05

Enigmatic: The String Quartet Tribute To Radiohead



Destino: qualquer.
Vento, folhas dançando, lã e um cigarro.
Meus passos eram adágio composto em tua homenagem e eu, que já não me importava com a existência dEle, pedi que guardasse teu sono e teu sorriso. Há algo belo e sagrado em ti que não me deixa sonhar.
Eloí Eloí, lamá, sabactani?
Escrevi ouvindo: Idioteque | The String Quartet

7.3.05

Mezzanine



Tu és divina e graciosa e levaste um pedaço de minh'alma.
No meu leito teu cheiro,
Na minha cabeça imagens tuas.

Acordei e uma lágrima doce molhou o travesseiro.
Deixe-me sonhar.
Escrevi ouvindo: Teardrop | Massive Attack

3.3.05

Post



Para quem já tinha lido e achar estranho, o último post se mudou pra cá. Há tempos tinha prometido postar lá e apareceu a chance. E digamos que foi providencial. Me deixou espaço para falar duas coisas que já deviam ter sido ditas.

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Da série "Grandes Amigos de Mudança" apresentamos hoje o grande Fernando Calvache. Rapaz, estarei torcendo muito por esta sua viagem e todos sabemos que não tem o que dar errado. Você é talentoso e que o RJ te aproveite bem. Samba!

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Terça deveria ter postado isto:

Paola, parabéns! Mais um diploma para essa guria que só me dá orgulho. Foi com ela que aprendi o que é doar-me de verdade. Ironicamente é sem ela que estou tentando aprender a ser feliz. ɉ outra que quer entrar na série "GrAM", mas é para um pouco mais longe do que o Rio. Mesmo não querendo dizer isto, direi: boa sorte e que tudo dê certo com os planos para a viagem. Você merece.
Escrevi ouvindo: I Miss You | Bjork

Lost In Translation [Encontros e Desencontros]



Meu primeiro carrinho. Um bólido de F1, plástico amarelo, rodas atrás maiores que as da frente, o capacete vermelho do piloto. Perfeito.
Com o tempo acidentes naturais foram acontecendo. Pneu €œ"furado"€�, uma roda que escapava, os adesivos do aerofólio que desgastaram de tanto brincar na chuva, capacete desbotado e amarelo. Alguns remendos, uma troca improvisada de roda e o F1 continuava sendo lí­der.
Com o natal veio a ameaça. Uma picape, plástico muito mais rí­gido, uma chavezinha na caçamba que permitia que desmontasse-o inteiro e voltasse a montá-lo. O F1 já não me dava tanta atenção e nem eu a ele. Mesmo assim sabiamos que era meu preferido.
Um tempo sem brincar com ele mas um dia a vontade veio. Fui procurá-lo e já aos prantos corri buscar ajuda materna que comunicou-me a partida do amarelinho para outra casa. Agora estava nas mãos de outro garoto.
Demorou mas o tempo me consolou. Sabia que ele tinha dado o melhor de si e eu também havia aproveitado ao máximo o tempo que passamos juntos. Esse sentimento durou até o dia que vi seu novo dono fazendo estripulias na areia do parque com meu ex-carrinho, brincadeiras que nunca havia imaginado fazer e, mais do que nunca, quis tê-lo de volta. O olhar sarcástico do garoto parecia refletir meu descuido com meu pequeno bólido. Corri para casa chorando mas meu lado vil já havia preparado a vingança. Peguei o carrinho do natal, aquele que o volante girava e comandava as rodas da frente e podia ser desmontado e montado infinitas vezes. Voltei para o parque e comecei a exibir meu novo brinquedo. Senti prazer ao ver que conseguira estragar a diversão do vizinho. Seus olhos não conseguiam desviar da picape. Convidou-me para brincarmos juntos e eu, cheio de raiva e rancor por algo que não era culpa de ninguém, cumpri meu papel de estúpido e agora era ele que corria para casa às lágrimas. Vitória.
Ledo engano. A noite chegou e sentia-me mal por ter sido escroto, por ter desejado mal, por ter magoado alguém.
Amanheceu, corri para o parque na esperança de que o garoto estivesse por lá, brincando com meu ex-carrinho. Arritmia, garganta seca e euforia. Lá estava ele. Aproximei-me mas ao perceber minha sombra levantou-se e começou uma corrida para longe de mim.
"€œEspera. Quer brincar com meu carrinho?"
Merda. O que eu estava falando? Aquele carrinho amarelo era meu por direito e agora eu partilharia mais ainda do que era meu?
De súbito parou e ficou assim por um tempo, parecia refletir sobre o convite. Virou-se e sorrindo ofereceu-me "€œseu"€� carrinho como troca. Aceitei. Chamados para o almoço, nos despedimos e acabamos trocando definitivamente os brinquedos. Não consigo lembrar de nenhuma outra refeição preparada por minha mãe tão boa quanto aquela. Ele estava de volta comigo, era meu de novo.

Vieram pêlos, adeus infância. Continuo sem saber me desfazer daquilo que amei e as coisas não são mais tão simples como ter uma picape para fazer o olho do outro garoto encher de lágrimas.
Porra, alguém me perguntou se eu queria crescer? Caro senhor sádico, devolva minha infância, por favor.
Escrevi ouvindo: Girls | Death In Vegas