stereoloser

1.6.04

Happy Songs For Happy People



Já estava acostumado ao cinza frio de Curitiba. Mesmo assim evitava abrir os olhos enquanto não chegava ao destino. Temia congelar a Alma, ou pior, o choque térmico. O de ver um cachecol atrás do fumê, aquecimento ligado, e ali do lado, papelão e jornal empilhados, cobrindo uma pele azul.
Descobriu que deixar de ver não diminuia a dor. Pupilas embaçadas ao ouvir que a pele só estava azul porque não queria trabalhar. Aquele monte de papelão, cheirando a merda, só afastava outros gorros. Curitiba não era a mesma. Culpa da invasão dos pelescura na cidade modelo. Pelo menos assim, azuis, ficavam menos nojentos.
Decidiu não ouvir mais. Tinha medo. Mas o olfato continuou a provocar e encontrou bálsamo e mijo, um passando, o outro ficando, doído, apertado, massacrando.
Anestesiou o nariz. Sem oxigênio parou de pensar, a dor passou, não sentia nada, não ouvia. Aos poucos foi deixando de existir e o frio virou brisa, frio novamente até sentir o gelo entrando por baixo da pele. O inferno tinha sua parte azul.
Sem entender o motivo de estar lá procurou abrigo. Frio insuportável. Casacos, gorros, cobertores, todos desfilando com pressa, ignorando-o. Percebeu que bloquear os sentidos tinha sido seu pecado e viu que ele mesmo era lã. Entendeu o inferno e quis voltar.
Tarde demais, seu puto.

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Escrevi ouvindo: I Know You Are But Who Am I? | Mogwai